Meu pai tinha profunda admiração por Rui Barbosa. Nas estantes lá de casa a gente dividia os livros entre Rui e os outros. Alguns livros daquela época eu conservo comigo até hoje, cuidadosamente encadernados. Oração aos Moços, Cartas de Inglaterra, Orações do Apóstolo, Correspondência (organizada por Homero Pires). Todos os livros estão com palavras e frases grifadas em lápis vermelho, o que revela uma leitura, quem sabe releitura, atenta. Eu muitas vezes passei pelo prédio da Rua do Rosário esquina com o Beco das Cancelas, no Rio de Janeiro, onde funcionou o escritório de advocacia de Rui Barbosa. Passava ansioso para chegar ao velho Bico Doce, famoso pelas feijoadas. E quem de vocês, leitores, já visitou a Casa de Rui Barbosa (Rua São Clemente, 134 - Botafogo, Rio de Janeiro)? Uma verdadeira chácara que Rui chamou de Villa Maria Augusta, em homenagem à esposa. A casa é conservada até hoje como era habitada pela família de Rui. Com estantes, muitas estantes, repletas de livros. Rui era o que se considera hoje um leitor voraz. Dizem que o que recebia de subsídios de suas funções como Deputado e Senador ele gastava tudo com os livreiros. Ele e sua família viviam bem, frequentavam os bons ambientes do Rio de Janeiro, e faziam parte da elite. Mas Rui Barbosa não era rico. Para comprar esta casa teve que recorrer a empréstimo bancário.
Rui revelou-se, desde cedo, um menino precoce. Seu pai incentivava a que se tornasse um orador, fazendo-o subir em um caixote e discursar. Tornou-se um mestre da oratória, reconhecido até pelos inimigos. Formou-se pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde meu avô também estudou uns vinte anos depois. Ali foi muito influenciado pelo pensamento de José Bonifácio de Andrada e Silva, o moço. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Foi redator-chefe do Jornal do Brasil em 1893, fundado por seu amigo Rodolfo Epifânio de Souza Dantas para defender as posições monarquistas. E por ter publicado manifesto do Almirante Custódio de Melo na Segunda Revolta da Armada teve que se exilar na Inglaterra, perseguido por Floriano.
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Rui não foi um republicano da primeira hora. Pelo contrário, fez a maior parte de sua carreira durante o Império, e foi neste período que recebeu o título de Conselheiro, que conservou mesmo após a proclamação da República. Chegou a ser indicado para fazer parte do Gabinete Ouro Preto, quando Deodoro interrompeu o processo. Era um abolicionista, isto sim, desde muito cedo, ainda estudante em São Paulo. Escrevia artigos inflamados, o que mereceu uma chamada de atenção de seu pai, recomendando moderação. Mas apesar de sua inclinação monarquista (esta era a proposta inicial do Jornal do Brasil), foi convidado e escreveu o decreto número 1 da República, e foi dele a denominação de Estados Unidos do Brasil. Foi candidato, contra sua vontade, a Presidente da República, e todas as vezes perdeu.
Por indicação do Barão do Rio Branco foi o representante brasileiro na Segunda Conferência da Paz, que aconteceu em Haia em 1907. Lá conseguiu a admiração e o respeito dos demais membros da Conferência, e retornou ao Brasil em triunfo, sendo chamado de "Águia de Haia".
Rui era um defensor intransigente da legalidade e do civilismo, da ética, e do papel do advogado na sociedade, como se pode ler na Oração aos Moços, discurso escrito por ele e lido pelo professor Porchat para os formandos de 1920 da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Mas como se comportou Rui como Ministro da Fazenda, num País onde o nepotismo e o compadrio vêm de muito longe e perduram até hoje? Levantamento muito interessante foi feito por José Murilo de Carvalho em seu trabalho Rui Barbosa e a Razão Clientelista. Foram pesquisadas cartas de pedidos ora dirigidos a ele, ora à dona Maria Augusta. Pedidos insistentes e sem cerimônia. Alguns, como de seu amigo e protetor Senador Dantas, chegavam à arrogância. Pedidos de emprego, nomeações, transferências, promoções, aumentos de remuneração, benesses, tudo quanto era possível. Mostrando que esta prática passou incólume do Império para a República. A alguns, Rui negou peremptoriamente. A outros, contemporizava. E aqueles muito especiais (recebeu pedido até do Marechal Deodoro, Presidente da República), teve que atender.
Um juri constituído pela Revista Época escolheu em 2006 Rui Barbosa como o maior brasileiro da História. Não é pouca coisa, entre tantos nomes de ruas e praças pelo País afora.
Permitam-me encerrar citando duas frases muito conhecidas de Rui Barbosa, que aparecem até no Facebook, como comentário aos tempos sombrios em que vivemos.
"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto."
"A pátria é a família amplificada. E a família, divinamente constituída, tem por elementos orgânicos a honra, a disciplina, a fidelidade, a benquerença, o sacrifício."
Rui revelou-se, desde cedo, um menino precoce. Seu pai incentivava a que se tornasse um orador, fazendo-o subir em um caixote e discursar. Tornou-se um mestre da oratória, reconhecido até pelos inimigos. Formou-se pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde meu avô também estudou uns vinte anos depois. Ali foi muito influenciado pelo pensamento de José Bonifácio de Andrada e Silva, o moço. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Foi redator-chefe do Jornal do Brasil em 1893, fundado por seu amigo Rodolfo Epifânio de Souza Dantas para defender as posições monarquistas. E por ter publicado manifesto do Almirante Custódio de Melo na Segunda Revolta da Armada teve que se exilar na Inglaterra, perseguido por Floriano.
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Rui não foi um republicano da primeira hora. Pelo contrário, fez a maior parte de sua carreira durante o Império, e foi neste período que recebeu o título de Conselheiro, que conservou mesmo após a proclamação da República. Chegou a ser indicado para fazer parte do Gabinete Ouro Preto, quando Deodoro interrompeu o processo. Era um abolicionista, isto sim, desde muito cedo, ainda estudante em São Paulo. Escrevia artigos inflamados, o que mereceu uma chamada de atenção de seu pai, recomendando moderação. Mas apesar de sua inclinação monarquista (esta era a proposta inicial do Jornal do Brasil), foi convidado e escreveu o decreto número 1 da República, e foi dele a denominação de Estados Unidos do Brasil. Foi candidato, contra sua vontade, a Presidente da República, e todas as vezes perdeu.
Por indicação do Barão do Rio Branco foi o representante brasileiro na Segunda Conferência da Paz, que aconteceu em Haia em 1907. Lá conseguiu a admiração e o respeito dos demais membros da Conferência, e retornou ao Brasil em triunfo, sendo chamado de "Águia de Haia".
A Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro |
Um juri constituído pela Revista Época escolheu em 2006 Rui Barbosa como o maior brasileiro da História. Não é pouca coisa, entre tantos nomes de ruas e praças pelo País afora.
Permitam-me encerrar citando duas frases muito conhecidas de Rui Barbosa, que aparecem até no Facebook, como comentário aos tempos sombrios em que vivemos.
"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto."
(11 de maio de 2015)
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